Mais do que uma estrada, a vida é um tabuleiro de xadrez onde devemos antecipar dezenas e dezenas de jogadas de adversários simultâneos para que o xeque-mate final seja nosso.
Todas as histórias infantis têm uma moral associada cujo verdadeiro significado só percebemos muitos anos mais tarde. Não só a Branca de Neve dorme um sono amaldiçoado por ter aceite uma maçã de uma velhinha desconhecida, embora de ar bondoso, como o Nemo se vê do outro lado do mundo só porque se afastou do pai numa férrea manifestação precoce de independência.
Relembro agora uma música do Capuchinho Vermelho que acompanhava um dos livros preferidos da minha infância e na qual a personagem cantava com a sua voz doce:
Pela estrada fora eu vou tão sozinha, levar a merenda à minha avózinha. Ela mora longe e o caminho é deserto e o lobo mau passeia aqui tão perto.
Longe estava eu de perceber que esta história encerrava uma das lições de vida mais importantes:
À nossa frente apenas o caminho, que traz consigo uma missão a cumprir. Por mais deserto e seguro que este caminho nos pareça, por trás de pelo menos uma das árvores estará algo à nossa espera. Um obstáculo a vencer e não a contornar. E o melhor é seguirmos sozinhos. Ou expectavelmente sozinhos. Isto porque a famosa Lei de Murphy se aplica até nas situações de vida mais quotidianas: As pessoas revelam-se e revelam-se precisamente nos momentos mais críticos desta nossa travessia, onde somos confrontados com as maiores surpresas e as maiores desilusões:
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Descobrimos com tristeza que, frequentemente, a maldade mora ao nosso lado.
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Descobrimos que quando estamos prestes a cair há sempre uma mão que nos segura e que, surpresa das surpresas, raramente é de quem nós estaríamos à espera.
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Descobrimos que a mão de Pilates, aquela que nos dá o toque final para o desiquilíbrio e logo de seguida lava daí a sua responsabilidade enquanto assiste de forma impávida e serena à queda fatal, pertence precisamente àqueles que faziam parte do círculo dos que nos eram mais queridos, mas que afinal nunca nos quiseram bem.
E é neste momento que o refrão da história faz todo o sentido.
(...) o caminho é deserto e o lobo mau passeia aqui tão perto.
A vida é um caminho deserto (e não através do deserto) ao longo do qual devemos contar apenas connosco. Confiar nos outros, é arriscarmos-nos a dar de caras com o mais inesperado lobo mau que estará estrategicamente à nossa espera, no sítio onde estaremos mais desprevenidos, no momento onde estaremos mais frágeis.
Mais do que uma estrada, a vida é um tabuleiro de xadrez onde devemos antecipar dezenas e dezenas de jogadas de adversários simultâneos para que o xeque-mate final seja nosso.
E se estamos à espera que no último minuto apareça o caçador que salva o Capuchinho Vermelho das garras do Lobo Mau, o melhor é lembrarmos-nos que não estamos num filme da Disney ou da Pixar Studios; como diria o chapeleiro louco na história da Alice no País das Maravilhas, outra com uma moral interessante e para reter: "We're all Mad Here"
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