Há um dia por ano que nos calha a todos. É o nosso aniversário; e este ano, por felicidade do destino, fui premiada com um fim de semana onde pude gozar os mimos em pleno.

De manhã, Simão veio a correr e mergulhou em cima de mim presenteando-me com um abraço que não coube no tempo. Os anos vão-nos ensinando a agradecer a verdadeira importância das coisas e nada no mundo me teria alegrado mais do que o amor que abraço carregava.

"Parabéns mãezinha" - gritou ele efusivamente naquele tom irónico tão meu e que tão bem o caracteriza, só igualado pelo incrível mundo de Gumble que avidamente devoramos em conjunto aos fins de semana.

"Sabes mãezinha... Se a vida fosse um jogo de futebol estarias agora a entrar no último minuto da primeira parte. Já pensaste como vais viver a 2a?"

"A fazer-me ao penalty e a entrar de carrinho sempre que possa. Tem cuidado". Respondi eu no meio de uma gargalhada.

Simão nasceu com o dom da metáfora, e a comparação da duração média de vida à de um jogo de futebol fez com que eu rapidamente desse por mim a fazer uma retrospectiva desta primeira parte e rapidamente chegasse à conclusão que somos nuvens passageiras que se vão com o vento e meros castelos de areia erguidos à beira do mar. A vida corre contra o tempo.

Na primeira parte aprende-se que o nunca mais nunca se cumpre e que o para sempre acaba sempre; Que ainda não inventaram nada melhor do que o colo de mãe e que os poucos amigos que nos amparam a queda são muito mais fortes que os muitos que nos empurram.

A meio da primeira parte acusamos a falta de todos os que, no sentido real e figurado, deixaram de fazer parte da nossa vida. Falta dos que gostavam de nós e que, com muita coragem nunca tiveram vergonha nem orgulho em confessá-lo.

No final da primeira parte percebemos que não temos tempo, nem coragem, nem disponibilidade para odiar ninguém; para elevar o ódio de estimação a um estatuto mais importante que a nossa própria paz interior. Não queremos perder tempo a fazer tudo aquilo que odiar implica: pensar constantemente em quem não tem a mínima importância. Reconhecemos a sanidade da indiferença.

Acredito que a 2a parte nos traz a capacidade de reconhecer em nós a sabedoria para aceitar que as pessoas nunca atingem um grau de arrependimento. Acho, até, que se o disserem não iremos nem vamos querer acreditar. É melhor assim.